REFORMAS ESTRUTURAIS [PEDRO PINTO]
30 Agosto, 2022
30 Agosto, 2022
Reformas Estruturais, um jargão repetido desde que entrou no léxico Nacional. A cada passo e como símbolo do ensejo de mudança, as reformas estruturais são-nos anunciadas. Ou melhor, a sua imperiosa necessidade é-nos anunciada e, na generalidade, concordada por quase todos.
Serão mudanças na sociedade originadas por políticas públicas que alterarão estruturas sociais – económicas, jurídicas, comportamentais – para melhores patamares. Por outras palavras, ações políticas que mudem para melhor o funcionamento (de partes) da sociedade.
No entanto o Nosso País é avesso à mudança. Inventar, a ação que nos trouxe da idade da pedra, é, vejam bem, por estas partes um pejorativo. As razões são profundas, mas não são para este texto. À partida, os caminhos são os habituais, não se muda nada, muda-se para ficar na mesma ou copia-se um modelo que nos é imposto.
Na generalidade vive-se bem por cá. Muito bem até. Mas há factos que não podem ser descurados. Somos perigosamente deficitários em energia, alimentação e a dívida externa, pública e privada, é monstruosa. Para agravar a situação, a indústria é residual e, tirando um ou outro caso, tecnologicamente dependente do exterior. Estamos estagnados economicamente, dependentes de subsídios e dívida. Agora sem a mola demográfica que ora tirava o país da miséria, ora tirava as pessoas do País em fuga da miséria.
É certo que estamos num mundo interdependente, inseridos num bloco político. Assim sendo, pensamentos de equilíbrios nacionais de século XIX não são mais válidos. No entanto, do futuro próximo o que é certo é que será perigoso. As explosões demográficas continuarão, agora sem uma potência hegemónica, e com elas novas tensões e novos perigos de desregulação da ordem estabelecida. Por outro lado, em todo o chamado “Ocidente”, a clivagem política agrava-se de dia para dia, desaparecendo os galantes adversários substituídos pelos pérfidos inimigos. Tão expostos como estamos, somos obrigados a preparar os piores cenários. E mesmo que tudo corra pelo melhor, no fim viveremos sempre em função do nosso esforço coletivo.
E onde estamos hoje não é animador, precisamos mesmo de fazer reformas estruturais, precisamos de melhorar coletivamente.
(In)felizmente estamos numa má altura para fazer reformas. Nas alturas de “abundância” – leia-se abundância nos estratos dominantes – nunca se fazem reformas, é como ser operado quando se tem saúde, as condições são as melhores, mas a motivação está ausente. Já diz o ditado que mais vale um pássaro na mão que dois a voar… e assim fica até ao dia em que o pássaro na mão adoece e morre. Não é um problema exclusivamente nacional, mas admito que a pouca propensão coletiva para a perspetivação e planeamento do futuro ainda o agrava mais. Mas haja esperança.
Como, sem ideias e propostas é que não se conseguem aplicar reformas, aqui fica uma:
A Indústria da Construção Civil e Obras Públicas (ICCOP) é um elemento essencial de qualquer sociedade moderna, e no caso português ainda mais dado o caracter exportador de uma parte da Indústria.
Das políticas públicas que defendo para o sector divido em três áreas: a política de investimentos; a política de formação e a política de regulação da indústria. Embora considere que as restantes áreas também necessitem de reformas, é na política de regulação que penso residir a mais significativa oportunidade de mudança.
Nas sociedades mais avançadas, o papel de regulador é central em muitas atividades (na regulação da banca, dos seguros, das telecomunicações, dos media, da energia, do saneamento etc.). O objetivo é a salvaguarda do interesse público permitindo aos privados a prossecução dos seus fins e interesses em condições conhecidas.
No caso da Indústria da Construção Civil e Obras Públicas (ICCOP), a regulação tem ocorrido essencialmente na habilitação para a atividade - os Alvarás. Se este controlo da habilitação é algo necessário, não se encerra aí, a meu ver, o interesse público e muito menos o bom ambiente de negócios desejado pelos privados.
Daqui a minha proposta:
O Regulador deverá também regular:
- Contratos de Empreitadas;
- Contratos de Subempreitadas;
- Contratos de Fornecimentos.
A indústria tem muito a ganhar com uma estabilidade contratual onde o equilíbrio das prestações seja ditado às partes, mantendo necessariamente o espaço para adaptações. O uso dos modelos FIDIC poderia ser um passo.
Da mesma forma, e como consequência, deveria regular a constituição de:
- Caderno de Encargos;
- Anteprojetos;
- Projetos de execução.
Não se trata aqui de qualquer limitação à componente criativa dos projetos, apenas o que cada um deve conter e com que detalhe.
Mais uma vez, a indústria tem tudo a ganhar com elementos formatados de modo previsível.
Se os elementos enumerados atrás permitem maior previsão, controlo de custos e também maior certeza jurídica, não anulam, nem tal é possível numa sociedade livre, a litigância.
Aqui o Regulador deve intervir criando ou supervisionando:
- Centros de Arbitragem;
- Comissões de avaliação;
- Conselhos de Litígios “Dispute Boards”.
Tornando-os obrigatórios e dando à Indústria a certeza de que resolve os conflitos em semanas e meses e não em anos e décadas.
Finalmente, o Regulador seria também o depositário das habituais garantias de boa execução, obrigando a que fossem cruzadas com obrigatórias garantias de bom pagamento, as quais também guardaria. Aqui a vantagem é de evitar eventos sistémicos, onde falências originam falências.
Resumindo, os benefícios diretos seriam:
- Mais certeza jurídica, pelo uso de contratos conhecidos de todos;
- Mais certeza técnica, pelo uso de projetos mais completos e de forma conhecida;
- Mais certeza económica, pela normalização da atividade e garantia do edificado;
- Mais certeza financeira, pela presença de garantias de bom pagamento.
O significativo aumento da produtividade da Indústria ocorreria como somatório de:
- Aumento dos bens de capital (instalações, máquinas e ferramentas), pois a maior previsibilidade do negócio reduz o risco e assim melhora as condições de investimento.
- Aumento das competências dos trabalhadores, resultado de processos de especialização e acrescida eficácia da formação profissional.
- Diminuição de desperdício de recursos (humanos e materiais), resultado da normalização, diminuição de litígios e rápida resolução dos mesmos.
Como pode ser constatado, a implementação das medidas pode ser realizada em poucos meses pois o Regulador já existe, os exemplos e modelos abundam e a contribuição das Associações Industriais, Banca, Seguros, Associações Profissionais e de diferentes Organismos do Estado serão certamente valiosos.